segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

Maria de todos os meses



Rafael

Maria de todos os meses
Marlei Sigrist

Resumo: As festas populares religiosas obedecem a ciclos, mas as festas em homenagem à Maria ocorrem durante todo o ano. Em dezembro, no início do ciclo natalino acontecem as festas de Conceição e de Caacupé.


As festas, de maneira geral, são marcantes na história da civilização humana. Vistas como um aspecto da cultura, elas podem ser interpretadas como uma compensação simbólica das insatisfações econômicas, políticas, religiosas, quando o povo, não importando a que classe pertença, impõe uma ordem de poderes através da organização cerimonial e às vezes demonstra as contradições da sociedade. Desassistido, social e economicamente, o povo encontra nos santos, nos orixás e em outros seres possuidores de poderes, a última saída para a solução dos males que sofre, fazendo deles seus intermediários no diálogo entre a terra e o céu.

Grande parte dessas festas, então, está ligada à religiosidade e, no catolicismo popular, obedecem a diversos ciclos, como o de Maio, do Natal, da Páscoa. O tempo da cultura popular é cíclico, é o tempo sazonal  que, em português, quer dizer estação (derivado de sazão - em latim - sátio - época do ano em que se semeia), marcado pelas águas e pelas secas; tempo lunar, marcado pelas marés, pelo cio dos animais, gestação, criação e abate; tempo do ciclo agrário, da semeadura à colheita, do descanso da terra. O calendário religioso festivo da Igreja, a partir da Idade Média, foi vinculado ao calendário festivo pagão, quando as festas máximas estavam distribuídas nas datas próximas aos solstícios e aos equinócios. A Igreja escolheu as datas comemorativas dos santos, seguindo as mesmas demarcações.

Maria, mãe de Jesus, pertence a todos os ciclos e a todos os tempos e, por isso, todos os meses cultua-se pelo menos uma delas, sob a designação universal de Nossa Senhora. A iconografia de Maria nos mostra uma classificação de acordo com as fases de sua vida, como:

Infância: representações de Maria menina, junto a seus pais;
Imaculada Conceição: imagens de Maria em sua juventude, com cabelos soltos, como o de Aparecida, Conceição, Fátima, Lourdes e outras. Acredito que a nova Nossa Senhora do Pantanal pertença a essa classificação;

Encarnação: representações da encarnação do Verbo, desde a presença do Anjo Gabriel até o nascimento de Jesus, como Amor Divino, Anunciação, Bom Despacho, etc.;

Virgem Mãe: invoca Maria com o Menino e o que distingue umas das outras são os símbolos que ela e o Menino carregam, como Rosário, Carmo, Mercês, Misericórdia e tantas outras;

Paixão: são imagens ligadas ao sofrimento de Maria, durante a paixão e morte de seu Filho, como Dores, Angústias, Piedade, etc.;

Glória: representações ligadas à glorificação de Maria após sua morte e coroação no céu, como Assunção, Anjos, Glória, Graças, Boa Morte, dentre outras.

Os nomes de Maria, no Brasil, superam a casa de um mil e quinhentos e variam de acordo com suas aparições (visões) ou de manifestações de natureza extraordinária marcadas em presença de pessoas, ou ainda, conforme as graças recebidas.

Dentre tantas Marias, o dia 8 de dezembro é dedicado à Nossa Senhora Conceição que, segundo o mestre Câmara Cascudo, foi sincretizada no Candomblé com Iemanjá, a rainha do mar. Com este orixá, também outras Nossas Senhoras foram identificadas, como: do Rosário, do Carmo, da Piedade, dependendo da região. De qualquer maneira, a festa de Nossa Senhora Conceição está inserida no ciclo do Natal, que se estende até seis de janeiro, dia dos Reis Magos.

Na fronteira do Brasil com o Paraguai, comemora-se, nesta mesma data, Nossa Senhora de Caacupé (da foto). Entre os paraguaios, ela tem a mesma força espiritual e veneração que N.S. Aparecida tem entre nós brasileiros. A iconografia das santas, na América Latina (espanhola), de modo geral, traz novos elementos, como as jóias, destinadas ao embelezamento daquelas, como pode ser observado na foto.

A Virgencita de Caacupé, como é chamada,  recebe homenagens durante as missas e rezas, culminando com almoços ou jantares à base de pratos típicos da cozinha  paraguaia e bailes ao ritmo de polca, chamamé, exibição da Galopeira, do Toro Candil e outros. A principal manifestação desta festa acontece entre os membros da Associação da Colônia Paraguaia, em Campo Grande/MS, embora existam cultos particulares, reunindo famílias, e distribuídos por diversos bairros da Capital e cidades do Estado, como em Porto Murtinho, Bela Vista e Ponta Porã.

Dos vocábulos da cultura indígena, caá, que significa erva-mate e cupé, que significa atrás, forma-se a palavra Caacupé, cuja tradução é “atrás da erva- mate”. Conta uma lenda indígena, que um índio caçado por seus patrões, lembrou-se de pedir socorro à Virgencita. Escondendo-se atrás de um pé de erva-mate, ficou a rezar durante todo o tempo da perseguição, até que os patrões desistiram da busca. Acreditando ele ter sido salvo pela Virgem resolveu esculpir uma imagem à semelhança da santa, utilizando-se da madeira da erva-mate. Os fiéis comentam  que a primeira imagem encontrada desta santa é uma escultura feita em madeira de erva-mate. Portanto, diante de uma manifestação de natureza extraordinária, foi criada mais uma das muitas Marias.

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